top of page

Salve a Rainha James!

Atualizado: 14 de fev.

Resenha: O Rei James I e a História da Homossexualidade

by Michael B. Young

(New York University Press, 2000)


Há séculos, O Rei James I da Grã-Bretanha e VI da Escócia (1566-1625) tem sido visto como uma das grandes rainhas da história, frequentemente menosprezado, considerado um tolo devasso e, de vez em quando, elogiado pelo seu "orgulho gay".


Quando o Conselho Privado (Privy Council) o repreendeu por beijar e acariciar seu favorito, George Villiers, tão escancaradamente em público, James se defendeu dizendo "Cristo teve seu John, e eu tenho meu George".


Michael Young, professor de História da Illinois Wesleyan University, traz seu sólido conhecimento histórico para lidar com uma questão que é, frequentemente, monopolizada por teóricos da cultura e de sociologia nos Departamentos de Literatura.


Young integra, com maestria, a história sexual com a história política para demonstrar como a homossexualidade de James provocou uma política especificamente homofóbica.


As virtudes de James – seu zelo pela paz e sua habilidade acadêmica – eram vistas como sinais de efeminação e de homossexualidade.


A rainha Elizabeth I era elogiada por se comportar como um rei, e James era criticado por se comportar como uma rainha.


As sátiras políticas contemporâneas atacavam a política externa pacifista de James, entrelaçando imagens de efeminado, afetado e perversão sexual com imagens de um mundo político turbulento.


A política externa de James foi criticada como sendo afetada e pacifista, e esta crítica política era adicionada a críticas aos seus favoritos afeminados.


E de sua Corte, a Rainha Anne facilitava esses ataques, encorajando os entusiasmados quanto à guerra contra a Espanha, enquanto também encorajava seu filho, o príncipe Henry, a ser fervorosamente militarista. Mãe e filho ressentiam amargamente a homossexualidade de James.


O Príncipe Henry morreu prematuramente em 1612, mas um legado desastroso da reputação de James como um pacificador afeminado foi que o segundo filho de James, Charles, fez tudo o que pôde para evitar ser considerado esquisito como seu pai.


Charles, com profunda repulsa pelo estilo de vida de seu pai, definiu-se como seu oposto, e tornou-se um rei guerreiro e modelo do devoto, pai de família heterossexual. Em sua corte, Charles criou uma iconografia de uma vida doméstica idílica. Enquanto que prosseguiu com guerras até que sua Tesouraria não pudesse mais sustentá-las.


Desde sua juventude, James manteve relações indiscretas com homens. Seus contemporâneos reconheciam, não só que ele amava homens, mas que ele ativamente não gostava de mulheres. Eles reconheciam que "seu envolvimento persistente com outros homens estava prejudicando seu casamento" com a rainha Anne.


As relações, cada vez piores, entre James e seu Parlamento não se deviam apenas à sua extravagância imprudente, mas também à sua homofobia. Eles se opunham ao seu comportamento pessoal, especialmente seu comportamento arbitrário com seu círculo de favoritos. A chegada de seu namorado, Robert Carr, como Pajem da Câmara Real, em 1607, por exemplo, marcou também a separação de James da Rainha Anne.


Young estabelece que não há dúvidas de que James amava o seu principal favorito, George Villiers (mais tarde declarado Duque de Buckingham). Nenhum dos contemporâneos de James duvidavam que ele havia dado seu coração a Villiers, e que Villiers havia dado seu corpo ao Rei.


Com exceção da prole, Young diz, "há pelo menos tanta evidência indicando que James teve relações sexuais com seus favoritos do sexo masculino quanto há evidências de que ele teve relações sexuais com sua esposa". Seus relacionamentos eram físicos, não só platônicos, e a seus contemporâneos não faltavam palavras para comentar sobre isso.


Existem, não só boatos abundantes e evidências circunstanciais, mas também evidências concretas encontradas em algumas das cartas de James a Carr e a Villiers – e também evidências de que ele não sentia vergonha ou constrangimento nenhum em exigir seus serviços sexuais. James se dirigiu a Villiers como "meu doce filho e esposa" e assinava como "seu querido pai e marido", enquanto Villiers, por sua vez, referia a James como sua "amante".


James provavelmente não teria se casado se não fosse pela necessidade de produzir herdeiros. A Rainha Anne ficou gravida a cada dois anos antes dos dois pararem de ter relações sexuais (ou seja, os últimos dezesseis anos do casamento), mas é difícil classificar James como "bissexual", já que sua clara preferência era por sexo com homens.


James condenou a sodomia em um de seus livros, mas ele provavelmente não pensava dele mesmo como "sodomita" pois as evidências sugerem que ele se envolvia em masturbação mútua em vez de relações sexuais anais. De qualquer forma, James era um notório hipócrita. Outros, no entanto, pensavam nele como um sodomita.


Young corretamente trata o caso de James como um teste importante para avaliar a precisão das teorias modernas da história da homosexuality. Grande parte do argumento de Young refuta as alegações reducionistas, e às vezes doutrinárias, do historiador gay Alan Bray.


Os sólidos argumentos históricos de Young demonstram que uma visão distintamente moderna da homossexualidade já estava bem estabelecida no início do século XVII. Young discorda especificamente da visão de Alan Bray de que na Inglaterra do século XVII a sodomia era vista como um pecado praticado por monstros.


Na verdade, era vista, sim, como um pecado, mas um pecado praticado por homens comuns. A retórica demonizante da Igreja não era empregada com tanta frequência como uma retórica mais realista de "antinatural", "vício", "perversão" ou "desvio", e algo a ser ridicularizado.

Aparte do clero, as pessoas empregavam palavras-código para falar sobre homossexualidade, por exemplo, "Ganimedes", uma alcunha mitológica para um namorado homossexual. E nos ataques políticos usavam palavras-código como "lacaios" e "favoritos".


Em outras palavras, a homofobia jacobina era fundamentada, não apenas nas crenças cristãs, mas na moralidade convencional, muitas vezes politicamente motivada – em geral, o mesmo tipo de homofobia encontrada hoje.


Ao contrário das alegações feitas por Bray, a maioria dos contemporâneos de James que o atacavam por amar outros homens não o viam como um monstro hediondo, nem empregavam o medieval" discurso sodomítico".


O discurso contemporâneo sobre o amor de James por outros homens era, na verdade, muito semelhante ao discurso moderno. Por exemplo, a efeminação "era parte integrante do discurso jacobita sobre as relações sexuais entre homens", e Young examina numerosos tratados que retratavam James como uma rainha, ou queer, em termos familiares hoje.


Young refuta a alegação de alguns historiadores gays (como Alan Bray e Alan Sinfield) de que a efeminação na Inglaterra do século XVII não era vista como estando ligada à homossexualidade. Embora houvesse usos relativamente infrequentes de "afeminado" para significar que um homem era excessivamente atraído por mulheres (ou seja, heterossexual!), na grande maioria dos casos, significava exatamente o que significa hoje e quase sempre estava associado a homens homossexuais. Homens como o rei James, cujo ideal era a juventude adolescente como Villiers, conhecida por sua beleza, suas bochechas sem pelos e pernas longas e finas.


Muitas das pessoas que atacavam James por amar outros homens, mesmo os mais venenosos, podem ter sido escandalosos desbocados que exploravam fofocas sórdidas – assim como o fariam hoje – porém não usavam um paradigma medieval de uma abominável sodomia.


Como diz Young: "Não há nenhuma sugestão de demônios, bruxas, papistas, monstros ou de uma completa depravação moral". Sir Anthony Ashley, por exemplo, simplesmente pôs James em uma classe abstrata de homens homossexuais: "aqueles que naturalmente odeiam mulheres".


Às vezes, James era comparado, com certo sensacionalismo, ao imperador Tiberius, conhecido por suas perversões sexuais na ilha de Capri. Com mais frequência, James era alvo de insinuações. Em suma, ele ficou marcado simplesmente como queer em vez de sodomita.


Sir Edward Peyton, em 1652, foi bem direto com sua linguagem, dizendo que "O vicio de James era amar homens mais do que mulheres... ele vendeu seus afetos a Sir George Villiers, sobre quem ele se jogava, beijando-o como a uma amante."


Em 1658, um dos contemporâneos de James, Francis Osborne, protestou que o que James fazia com seus favoritos em privado "excede minhas expressões, não menos do que excede a minha experiência", mas ele não rotulou essas atividades como sodomia, ou como pecado contra a natureza, reconhecendo que era "amor, ou seja lá o que for que a posteridade resolva chamá-lo".

Young demonstra, de forma convincente, que o que os contemporâneos de James reconheciam, embora lhes faltasse a palavra para isso, era o que a posteridade chamou de homossexualidade.


Young critica historiadores anteriores por tentarem escapar da questão da homossexualidade de James, e ele também critica os historiadores gays modernos por construírem um abismo entre os homossexuais modernos e os primeiros sodomitas modernos.


"Quanto mais aprendermos sobre o início do século XVII, mais estreito será o abismo entre então e agora." Young observa que a "história da homossexualidade é um campo de estudo relativamente novo no qual as hipóteses de alguns dos primeiros estudiosos tendem a se tornar pontos de vista doutrinários, vários dos quais parecem menos persuasivos depois de examinar o caso de Jaime VI e I".


Ele mostra que a abordagem de Alan Bray é reducionista, levando a dogmas teóricos que estudiosos posteriores, menos capazes, tentaram forçar como evidência.


Ele apresenta um argumento bem detalhado, passo-a-passo, que refuta substancialmente a linha de raciocínio de Bray. A teoria de que a homossexualidade é uma "invenção" do século XVIII, XIX ou XX revela-se como um erro grosseiro.


Young não encontra praticamente nenhuma evidência para apoiar a alegação de que ocorreu uma "revolução de gênero" no século XVIII, ou que a bissexualidade era a norma em períodos anteriores, ou que uma construção bipolar de heterossexual e homossexual não existia até os tempos modernos.


Muitas teorias, frequentemente sem evidências, continuam sendo citadas como se fossem fatos de livros didáticos, mas não são. Muitos historiadores, gays ou não, exageraram nas mudanças em detrimento do senso de continuidade.


Em suma, Young não encontra nenhuma corroboração para o suposto abismo entre os homossexuais modernos, os do início da modernidade e o preconceito contra homossexuais. Sua revisão exaustiva de panfletos, diários, cartas, memórias, peças de teatro, dicionários e fontes literárias contemporâneas revela uma continuidade, em vez de mudanças radicais nas mentalidades, restabelecendo uma humanidade comum entre os homens gays de hoje e os homens que se amavam no início do século XVII.

 

Texto Original


Long live Queen James

Updated: 6 days ago

A review of King James and the History of Homosexuality by Michael B. Young (New York University Press, 2000) King James I & VI (1566–1625) has long been seen as one of the great queens of history, sometimes dismissed as a wanton fool, sometimes praised for his “gay pride”. When the Privy Council rebuked him for kissing and fondling his favourite George Villiers so openly in public, James defended himself with the words “Christ had his John, and I have my George.” Michael Young, Professor of History at Illinois Wesleyan University, brings solid historical scholarship to bear upon an issue that is all too often monopolized by cultural and social theorists in Departments of Literature. Young skilfully integrates sexual history with political history to show how James’s homosexuality provoked a specifically homophobic politics. James’s virtues – his love of peace and his scholarship – were taken as signs of effeminacy and homosexuality.

Queen Elizabeth I was praised as being kinglike, and James was criticized as being queen-like. Contemporary political satires attacked James’s pacifist foreign policy by interweaving images of effeminacy, effeteness and sexual inversion with images of a topsy-turvy political world. James’s foreign policy was criticized as being effete and pacifist, and such political criticism was combined with criticism of his effeminate favourites. Queen Anne facilitated these attacks from her counter-court, encouraging those eager for war with Spain, and encouraging their son Prince Henry to be fervently militaristic. Mother and son bitterly resented James’s homosexuality. Prince Henry died prematurely in 1612, but one disastrous legacy of James's reputation as an effeminate peacemaker was that James’s second son, Charles, did everything he could to avoid being thought queer like his father. Charles, with a deep revulsion for his father’s lifestyle, defined himself as the opposite of his father and became a warrior-king and a model of uxorious heterosexuality. Charles pursued war until the Treasury could no longer sustain it. At court, he created an iconography of domestic married bliss.

James had indiscreet relations with men from his youth. His contemporaries recognized not only that he loved men, but that he actively disliked women. They recognized that “his persistent involvement with other males was damaging his marriage” to Queen Anne. The increasingly bad relations between James and his Parliament were due not simply to his reckless extravagance, but also to their homophobia. They objected to his personal behaviour, particularly to his wanton behaviour with his circle of favourites. The arrival of his boyfriend Robert Carr as Gentlemen of the Bedchamber in 1607, for example, also marked the separation of James and Queen Anne. Young establishes that there can be no doubt that James loved his primary favourite George Villiers (later made Duke of Buckingham). None of James’s contemporaries doubted that James had given his heart to Villiers and Villiers had given his body to the King. With the exception of offspring, Young says, “there is at least as much evidence indicating that James had sex with his male favourites as there is evidence that he had sex with his wife.” His relationships were physical, not platonic, and his contemporaries were not at a loss for words to comment on this. There is not only abundant hearsay and circumstantial evidence, but also concrete evidence in some of James’s letters to Carr and Villiers – and also evidence that he felt no shame or embarrassment in requiring their sexual services. James addressed Villiers as “my sweet child and wife” and signed himself “thy dear dad and husband”, and Villiers in turn likened James to his “mistress”. James probably would not have married but for the need to produce heirs. Anne did get pregnant every other year before they ceased having sexual relations (i.e. the last sixteen years of their marriage), but James can hardly be called “bisexual” since his clear preference was for sex with men. James condemned sodomy in one of his books, but he probably did not think of himself as a “sodomite” because the evidence suggests that he engaged in mutual masturbation rather than anal intercourse. In any case, James was a notorious hypocrite. Others, however, did think of him as a sodomite. Young rightly treats the case of James as an important test for assessing the accuracy of modern theories of homosexual history. Much of Young’s argument refutes the reductionist and sometimes doctrinaire claims of gay historian Alan Bray. Young’s solid historical scholarship demonstrates that a distinctively modern view of homosexuality was already well established by the early seventeenth century. Young specifically disagrees with Alan Bray’s view that in seventeenth-century England sodomy was seen as a sin practised by monsters. In fact it was viewed as, yes, a sin, but a sin practised by ordinary men. The demonizing rhetoric of the Church was not employed so often as a down-to-earth rhetoric of “unnatural”, “vice”, “perversion” or “deviation”, and something to be ridiculed. People, other than the clergy, employed code words to talk about homosexuality, e.g. “Ganymede” as a mythological epithet for a homosexual boyfriend. And political attacks used code words such as “minions” and “favourites”. In other words, Jacobean homophobia was grounded not only in Christian beliefs, but in conventional morality, often politically motivated – largely the same sort of homophobia found today. Contrary to claims made by Bray, most of James’s contemporaries who attacked James for loving men did not construe him as a hideous monster nor employ medieval “sodomitical discourse”. The contemporary discourse about James’s love for other men was actually very similar to modern discourse. For example, effeminacy “was an integral part of Jacobean discourse about sexual relations between males”, and Young examines numerous tracts which portrayed James as a queen or queer in terms familiar today. Young refutes the claim of some gay historians (such as Alan Bray and Alan Sinfield) that effeminacy in seventeenth-century England was not seen as being linked to homosexuality. Although there were relatively infrequent uses of “effeminate” to mean that a man was excessively attracted to women (i.e. heterosexual!), in the large majority of cases it meant exactly what it means today, and was nearly always associated with homosexual men. Men such as King James, whose ideal was the adolescent youth such as Villiers, noted for his beauty, his hairless cheeks and long slender legs. Many of the people who attacked James for loving men, even the most venomous, may have been foul-mouthed scandalmongers exploiting salacious gossip – just as they would today – but they did not use a medieval paradigm of horrid sodomy. As Young says, “There is no suggestion of devils, witches, papists, monsters or total moral depravity.” Sir Anthony Ashley, for example, simply placed James in an abstract class of homosexual men: “those that naturally hated women”. Sometimes James was luridly compared to the Emperor Tiberiuis, noted for his sexual perversions on the island of Capri. More often he was the subject of innuendo. All in all, he was simply branded as a queer rather than a sodomite. Sir Edward Peyton in 1652 was quite straightforward in his language, saying that “James was more addicted to love males than females . . . and sold his affections to Sir George Villiers, whom he would tumble and kiss as a mistress.” One of James’s contemporaries, Francis Osborne, in 1658 protested that what James and his favourites got up to in private “exceed my expressions no less than they do my experience”, but he did not call it sodomy or a sin against nature, but acknowledged that it was “love, or what else posterity will please to call it.” Young convincingly shows that what James’s contemporaries recognized, though they lacked the word for it, was what posterity has called homosexuality. Young criticizes earlier historians for trying to evade the issue of James’s homosexuality, and he also criticizes modern gay historians for constructing a gulf between modern homosexuals and early modern sodomites. “The more we learn about the earlier seventeenth century, the narrower the gulf between then and now will appear.” Young notes that the “history of homosexuality is a relatively new field of study in which the hypotheses of a few early scholars have tended to become doctrinaire viewpoints, several of which look less persuasive after examining the case of James VI and I.” He shows that Alan Bray’s approach is reductionist, leading to theoretical dogmas that later and less able scholars have tried to force onto the evidence. He presents a very detailed step-by-step argument with, and substantial refutation of, Bray’s line of reasoning. The theory that homosexuality is an “invention” of the eighteenth, or nineteenth, or twentieth century is shown to be a gross error. Young finds virtually no evidence to support the claim that a “gender revolution” occurred in the eighteenth century, or that bisexuality was the norm in earlier periods, or that a bipolar construct of heterosexual and homosexual did not exist until modern times. Many theories, quite unsupported by evidence, continue to be cited today as if they were textbook fact, but they are not. Many historians, gay or otherwise, have exaggerated change at the expense of contintuity. In sum, Young finds no corroboration for the alleged gulf between modern and early-modern homosexuals and prejudices against homosexuals. His exhaustive review of contemporary pamphlets, diaries, letters, memoirs, plays, dictionaries and literary sources reveals continuities rather than radical shifts in mentalities, and reestablishes the common humanity between gay men today and the men who loved one another in the early seventeenth century. (Part of this review was originally published in Gay News in July 2001. Copyright Rictor Norton. All rights reserved. Reproduction for sale or profit prohibited)


6 visualizações0 comentário

Comentarii

Evaluat(ă) cu 0 din 5 stele.
Încă nu există evaluări

Adaugă o evaluare
bottom of page